Sobre perdas e nem tudo ser como nós queremos - Resenha 7 Minutos Depois da Meia Noite (livro)
Para alegria de muitos e felicidade geral da nação, diga ao povo que estou de volta!
Ok, piadinhas a parte, hoje eu voltei para falar de um livro que li recentemente e que foi bem interessante para abrir minha cabeça sobre alguns temas, como perda, superação, vida, depressão, etc.
Não, o livro não fala diretamente sobre depressão, porém, como essa é uma situação que eu convivo (não comigo, necessariamente), consegui entender alguns pontos que respondem algumas ideias que estavam meio nebulosas na minha mente.
7 Minutos de Pois da Meia Noite é uma ideia de Siobhan Dowd que, após seu falecimento, Patrick Ness reutilizou ao escrever "A Monster Calls" (o nome da obra em inglês), sendo publicada no ano de 2011 e, em 2016, adaptada para o cinema por J. A. Bayona, que dirigiu "O Impossível" -aquele filme de tsunami baseado em fatos reais com o Tom Holland.
Acho relevante informar que eu não assisti o filme, apenas li o livro, porém, alguma cenas que vi juntamente com o trailer me parecerem bastante fieis às cenas das páginas, além de ter bons efeitos visuais, o que é importante para um obra de fantasia.
A Monster Calls é uma obra de fantasia infanto-juvenil que relata uma passagem da vida do jovem Conor O'Malley, um garoto de treze anos que tem constantes pesadelos.
Ele vive com sua mãe, que possui uma doença já em estado avançado, em que os tratamentos já não surtem mais tanto efeito quanto inicialmente o que resulta em seu corpo cada vez mais debilitado.
Isso retrata a vida de Siobhan ao idealizar a obra, que estava em estado terminal.
Seu pai já não vive com ele. Ele se mudou para os Estados Unidos e lá vive com sua jovem namorada e com sua filha ainda bebê. Suas ligações e visitas foram diminuindo com o passar do tempo, com a desculpa de que sua bebê vivia constantemente doente e precisaria dar-lhe atenção.
Sem a presença de seu pai e com sua mãe enfraquecendo mais a cada dia, o garoto precisa de alguém que ajude a cuidar não só dele, mas também de sua progenitora. Aí entra em cena sua avó, uma avó diferente das outras avós comuns.
Ela não é uma senhorinha simpática que dá dois reais escondidos para seu netinho e faz cuscuz com galinha pra ele almoçar aos domingos. Ela ainda trabalha -veja que curioso- como corretora de imóveis. Extremamente ocupada em seu escritório em sua casa chique, é uma mulher rígida, quase como um general do exército.
Para ela, nada que Conor faça está bom e todas suas atitudes são motivos de crítica. Isso torna a vida do garoto ainda pior, já que a única pessoa presente que possa lhe ajudar a conviver com os problemas simplesmente o trata como o Willy Wonka trata seus Oompa Loompas.
Na escola, o jovem sofre bullying dos valentões, levando constantes surras. Sua amiga Lily é a única pessoa que se move para lhe defender.
O problema? Lily foi a responsável pela escola inteira saber da doença de sua mãe. As mães de Lily e Conor, por serem amigas desde a infância dos dois, sempre mantinham contato. Lily ficou sabendo por sua mãe da doença da mãe de Conor, então ela contou a outras amigas que, por sua vez, contou para o resto da escola.
Isso deixou Conor P da vida, já que desde esse momento, todos começaram a mudar seu olhar para o jovem garoto. Não, não mudara, eles simplesmente pararam de enxergá-lo.
Conor passou a ser tratado como um ser invisível. Antes, era um dos mais aplicados, sempre levantava a mão para responder as perguntas, sempre se importava de fazer suas tarefas.
Desde então, os professores já não mais reclamavam se não respondia as perguntas, não brigavam com ele se não estivesse prestando atenção à aula, já não ligavam se ele arrumasse confusão. Conor não recebia reclamações, não confiava mais em Lily por isso. Todos passavam a mão em sua cabeça como se fosse um coitadinho. Mas por quê todos faziam isso? Sua mãe iria melhorar e mesmo assim todos o tratavam como um coitado? Não fazia sentido.
Diante dessas situações periclitantes, Conor ainda tem que lidar com pesadelos constantes. Ele sempre acorda gritando, pois uma sombra bizarra aparece em seus sonhos.
Até que, em certo dia, exatamente à 00:07 ele ouve seu nome ser chamado. Uma voz robusta, mas que ele não conhecia.
Ao sair pela janela, ele observa que o teixo que era visível de sua casa ao longe, lá no cemitério perto da igrejinha, já não estava mais lá. Na verdade, o teixo estava em sua janela, chamando seu nome.
O monstro, por sua vez, se intriga ao perceber que Conor não sentia medo. Conor pensou que o monstro seria a verdadeira face que o amedrontara em seus pesadelos, mas ele não sentia isso, não lhe passava o mesmo medo, por mais que uma árvore de quatro metros falante e assustadora estivesse em sua janela.
O monstro então diz a Conor que vai lhe contar três histórias e que a quarta será o garoto quem irá contar. Para isso, o monstro espera apenas uma coisa do jovem Conor: a verdade. A sua verdade.
Após alguns acontecimentos, novamente às 00:07, o monstro volta e lhe conta a primeira história:
Um rei bondoso se casa com uma jovem moça. Em seus últimos dias, o mesmo já não possui herdeiros, com exceção de seu neto. Ele morre e quem assume o poder é sua jovem esposa que, segundo alguns rumores, seria uma bruxa que, na realidade, só queria o trono. Já o neto se apaixona, fugindo com sua dama esperando voltar um dia para reclamar seu trono.
Entretanto, uma tragédia ocorre: sua amada é encontrada morta após ambos dormirem juntos ao pé de um teixo. Ele logo incita o povo acusando a rainha de ser a grande culpada. O povo se revolta e mata a rainha, tornando assim o jovem príncipe no próximo rei.
O teixo, que havia visto o que de fato ocorreu, diz a Conor que, na realidade, o próprio príncipe havia assassinado sua amada, com o objetivo de incitar o povo ao acusar a rainha do acontecimento, retornando assim seu poder.
A segunda história é do boticário e do pároco: havia um boticário muito hábil, mas extremamente ignorante e avarento. Ele sabia diversas receitas de curas que ajudou muitas pessoas, mas ele cobrava preços exorbitantes, mesmo de pessoas sem um tostão furado. Ele, por muito tempo, insistia para o pároco permitir que ele utilizasse do teixo próximo à igreja para suas receitas. O pároco, porém, não acreditava nas curandeirisses do outro homem. Pregava contra seus métodos, visando tirar seus seguidores da "idade das trevas" das simpatias de bruxarias.
O que acontece é que as duas filhas do pároco acabam adoecendo e, mesmo rezando intensamente, ele não consegue fazê-las melhorar. O boticário, porém, seria sua última opção. O religioso então abdica de tudo, implora, promete que enviaria todos os seus seguidores em qualquer caso de doença para o farmacêutico. Porém, o homem nega e na mesma noite, suas duas amadas filhas morrem.
O monstro, então, acaba destruindo a casa do pastor, ao invés de procurar o boticário. Não que o curandeiro estivesse certo em sua decisão, mas em tempos de bonança, o religioso pregou contra o boticário, o fazendo perder clientes, ser mal falado, levando-o praticamente ao ostracismo. O negou o teixo que, por sua vez, poderia ter salvo as vidas de suas filhas.
A terceira história conta a vida de um homem invisível que não era invisível de fato, mas que todos ignoravam sua existência. Certo dia, ele desejou ser visto.
Foi nesse momento em que Conor começa a desafiar seus medos. Herry, seu algoz, realiza sua ideia mais cruel: ao invés de simplesmente bater no garoto como sempre, ele simplesmente passa a ignorar sua existência. Isso faz com que Conor se revolte e passe a não permitir mais ser invisível. Ele agora será visto, seja pelo bem ou pelo mal.Juntamente com a imagem do monstro, Conor parte pra cima de Herry e o agride de tal maneira, com tal força que jamais havia sentido antes. Ele quebra o braço do valentão e todos ali observaram. Finalmente Conor seria punido, finalmente ele era visto, todos o observavam, mesmo que com medo, assustados. Não mais tinham pena dele.
No começo, realmente, na primeira visita do monstro, Conor recolhe uma sacola cheia de folhas e frutinhas do seu quarto, e sinais desse tipo aparecem em outros momentos. A ação do monstro parece existir quando ele se revolta contra Herry, quando ele destrói os móveis antigos e caríssimos de sua avó, mas no fim das constas, foram todas ações que um garoto desesperado e destruído por dentro poderia fazer.
As histórias, por sua vez, mostram aspectos bastante relevantes nesse processo de amadurecimento de Conor. O príncipe ensina que a realidade nem sempre termina com um final feliz, o boticário ensina que fé vazia sem ações para mudança não afetam em nada na vida, enquanto o homem/garoto invisível ensina que há necessidade de encarar os problemas, que ser invisível pode ser tão doloroso e escancarar uma realidade que, mesmo sendo negada, não deixa de ser real.
A quarta e última história, quem deve contar é Conor. Ele deve, enfim, encarar a verdade.
O monstro leva o garoto a enfrentar seu maior medo: seu pesadelo. No sonho, sua mãe é puxada por um abismo por uma sombra, ele tenta segurá-la mas, todas as vezes que ele solta sua mão, ele acorda. Dessa vez, deve ser diferente, ele deve entender que soltar sua mão faz parte da vida, que nossa história continua, mesmo após alguns finais amargos.
A verdade mais dura que Conor deve encarar é, justamente, aceitar o que ele mais deseja, mas que não admite: que sua mãe, enfim, descanse.
Não é fácil para ele assumir isso, pois ele sabe o quanto sua mãe sofreu, ele sabe o quanto ele mesmo sofreu e tudo o que ele mais quer é que todo esse sofrimento acabe. No fundo, ele sabe que os tratamentos já não fazem mais tanto efeito, que sua mãe está ficando mais fraca e que, em breve, não irá mais resistir.
Um dos pontos que mais mexeram comigo foi quando Conor pergunta ao monstro se um último tratamento, à base da árvore de teixo, será capaz de salvá-la. O monstro diz que, caso seja a vez dela, sim será salva.
No final, ao encarar finalmente seu pesadelo frente a frente, às 00:07 ocorre o inevitável, o monstro nunca mais apareceu, a verdade foi contada e Conor, por fim, aceitou a realidade. De maneira dolorosa, difícil, mas a realidade.
Essa história mexeu comigo particularmente, mesmo sem nunca ter perdido alguém próximo (humano). Mas, enfim, perdi meu gatinho, a quem eu tanto amava, há alguns meses.
Não sou de falar desses assuntos por aqui, mas achei pertinente, se tratando da obra que estou analisando.
Sou católico, veja bem, não sou extremamente conservador nem nada. Nem curto falar esses papos por aqui também. Mas devo dizer que sou muito apegado a Deus, no sentido de sempre recorrer a Ele -não só nos momentos difíceis, mas nos momentos de bonança também.
O ponto aqui é: quando perdemos alguém que amamos, nos perguntamos o porque de Deus (para nós, religiosos) permitir algo como isso ocorrer. Mas o que não entendemos é que a vida não é necessariamente justa. Não é que Deus quer nosso sofrimento, mas que precisamos lidar com momentos difíceis, encarar dificuldades para que possamos nos tornar mais fortes.
Percebem que esse papo extrapola o sentido de religião? Imagina só se a vida fosse feita apenas de coisas felizes: todo mundo era um teletubies. Mas, para que possamos ver beleza, para que possamos sentir alegria genuína, é preciso um contraste, um momento de dificuldade, precisamos ser fortes para encarar a vida como ela de fato é.
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